Brilho de Uma Paixão (Bright Star)

Com beleza e respeito, “Brilho de uma Paixão” explora o romance por traz das inspirações do poeta inglês John Keats.

Entre olhares e meias palavras, a diretora Jane Campion conta a história do icônico poeta John Keats e suas duas paixões: a poesia e Fanny Brawne. A primeira ele conquistou com muito esforço. Mesmo sendo enxovalhado pela crítica com seu longo poema “Endymion” em 1818, o jovem nunca se abateu, procurando se aprimorar cada vez mais para assim alcançar a perfeição. Já a segunda aconteceu de forma natural, como toda a paixão deve ser, mas um relacionamento do século 19 não dependia apenas da naturalidade de seus eventos.

Keats morava com seu amigo e companheiro de poesia Mr.Brown, um sujeito de caráter expansivo e personalidade amarga. Os dois viviam em meio à família Brawne, que era senhoria da casa em que moravam. Conforme o tempo passava, o relacionamento entre o poeta Keats e a garota de personalidade forte Fanny, se mostrava certo, apesar do jovem não possuir garantias mínimas do sustento da moça, o que era altamente recomendado pelas convenções matrimonias da época. Mesmo assim o envolvimento nasce, mas como esta é uma história de amor baseada em fatos reais, seu final esbarra em uma dura realidade.




Jane Campion conduziu o longa de forma tradicional e com muita pericia. Alicerçada pela ótima história que estava contando, destacou a inspirada fotografia de Greig Fraser, que revela a beleza da forma de seus cenários e personagens: os piqueniques na grama, as cores vivas das flores, as crianças que capturam borboletas, o poeta que se deita no topo da árvore, e a mulher que lê poesia junto à janela. Com muita fluidez, a diretora neozelandesa - que já conquistou a Palma de Ouro com o excelente “O Piano”-, não perde seu foco em momento algum, trabalhando de forma impecável os jogos de interesses, manipulações camufladas e sentimentos guardados tão costumeiros daquele período.

A atriz Abbie Cornish, que já viveu outra excelente história de amor ao lado de Heath Ledger no lisérgico “Candy”, consegue encontrar a maturidade exata para sua personagem. Fanny é uma mulher a frente de seu tempo: preza uma boa conversa, se mostra inventiva e talentosa com a costura da época, e também se interessa em aprender poesia. Suas angústias, envolvendo seu complicado romance, são sentidas com pesar pelo telespectador, sendo este o ponto de destaque da atriz. Dona de um olhar profundo, belo e ao mesmo tempo triste, seu semblante de esperança muitas vezes se contrasta com as impossibilidades impostas pelos fatos ao seu redor. Racional e estruturada, a personagem é com certeza os olhos e os sentimentos de seu público, que torce pelo amor do casal, mesmo sabendo que uma vitória é impossível.



Já a interpretação de John Keats ficou a cargo do vívido Ben Whishaw, que chamou atenção no sensorial “Perfume – A História de um Assassino”, e no surreal “Não Estou Lá”, que conta a história do cantor Bob Dylan. Neste “O Brilho de uma Paixão”, o ator mostra sua dedicação com a personagem, realizando uma interpretação inspirada e com sensibilidade, uma tarefa nada fácil, pois o peso dessa personalidade real apresentava suas responsabilidades. O interprete consegue encarnar este poeta sobrecarregado que acabara de perder seu irmão devido a uma grave doença. Todas as relações burocráticas ao redor de Keats fizeram com que ele vislumbrasse um futuro incerto, onde não encontrava possibilidades de concretizar a relação com sua amada. Este mesmo futuro acabaria culminando na aceitação fatídica de sua morte, mediante seu grave quadro de saúde.

Como coadjuvante de destaque do filme temos Paul Schneider, como o já citado Mr.Brown. O ator alcança o tom certo para este detestável amigo de Keats, que, apesar de suas palavras muitas vezes hostis, no fundo de seu coração carregava uma grande apreciação e preocupação por seu amigo, sendo suas atitudes uma forma pretensiosa de proteção.

John Keats teve uma vida curta. Morreu aos 26 anos de tuberculose na Itália. Mesmo com o pouco tempo que teve para sentir a plenitude de sua existência, deixou obras memoráveis para posteridade, alcançando uma fama que com certeza nunca pensou ser possível em vida. Através das cartas e poemas, destinadas para o irmão e sua amada, e tomando como base a biografia escrita por Andrew Motion, a diretora Jane Campion conseguiu capturar este breve momento da vida do jovem, um momento que ficou eternizado através de seus poemas, como sua eterna “Estrela Cintilante”, ou originalmente “Bright Star” (famoso poema de Keats). Com uma apresentação de créditos inovadora, somos arrastados para o mundo poético do autor e seu sublime poder das palavras. Literalmente, arte em sua mais pura essência.


Brilho de Uma Paixão/ Bright Star: Inglaterra, Austrália, França/ 2009/ 119 min/ Direção: Jane Campion/ Elenco: Abbie Cornish, Ben Whishaw, Paul Schneider, Kerry Fox, Edie Martin

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