Kingsman: Serviço Secreto (Kingsman The Secret Service)


Esnobes também sabem chutar bundas

A proposta primordial de Kingsman: Serviço Secreto é apresentar os heróis mais pomposos do cinema de ação. Nem mesmo James Bond é tão gentleman como os espiões dessa organização extremamente rica, que batiza seus integrantes com codinomes de famosos cavaleiros ingleses, como Lancelot, Galahad... enfim, "Homens do Rei". 


O filme foi dirigido pelo competente Matthew Vaugh, que misturou na receita alguns elementos de seus trabalhos anteriores, Kick-Ass: Quebrando Tudo e X-Men: Primeira Classe. Só que apesar do arrojo visual incrível elaborado para a fita, o resultado final, podemos educadamente dizer, é um tanto quanto deselegante, o que não chega a arruinar a experiência, mas meio que decepciona.




A história apresenta o caminho de amadurecimento do jovem Eggsy, que herdou do pai (ex-Lancelot) as habilidades necessárias para se tornar um Kingsman. Apadrinhado pelo honrado agente Galahad, o garoto precisará vencer um rígido processo de seleção para se tornar membro da organização. Além de arriscar sua vida, ele sofrerá também com estigmas sociais, devido sua origem simples, que é ofensiva aos jovens otários esnobes ingleses, que disputam a vaga com ele. 


Paralelamente a isso, o mogul da comunicação, conhecido apenas como Valentine, coloca em prática um plano para salvar a Terra de sua degradação ambiental sem precedentes. O cara é um ativista consciente, e em seu ponto de vista (um tanto quanto genocida), a raça humana é o câncer que está destruindo o planeta, e ele é cura para isso.


Kingsman: Serviço Secreto é vagamente baseado na HQ de Mark Millar e Dave Gibbons, intitulada apenas The Secret Service. Isso por que, além de mudar o nome, a adaptação faz diversas alterações na história original, preservando apenas o conceito principal da trama, que traz Eggsy e a absurda organização cheia de regras de etiqueta e agentes arrasadoramente mortais. Depois de Kick-Ass, essa é a segunda colaboração de Vaugh e Millar.



Pois bem, o grande problema de Kingsman: Serviço Secreto é a falta de empatia da história. Isso acontece, principalmente, porque roteiro e narrativa não conseguem desenvolver um tratamento natural para trama, e tudo acaba meio que mastigado demais em determinadas frentes. Galahad, por exemplo, é um grande personagem, que instiga nossa atenção, em contrapartida, o desenvolvimento de Eggsy e seus amigos soa artificial, esquemático. 


O treinamento retratado, que envolve afogamentos e pulos suicidas de paraquedas, tenta nos convencer que o pupilo é um cara honesto, dedicado e capaz, mas isso todo mundo já sabe desde sua primeira cena. Não existe espaço para dúvida nesta questão, não existe a sensação de evolução de Eggsy, não temos uma valorização eficaz de suas conquistas e habilidades. Enfim, todo esse processo de treinamento, que basicamente é a espinha dorsal do filme, parece um exagero desnecessário.



Sendo assim, as coisas se arrastam em termos de ritmo. A fita se mostra pouco convincente diante da transmutação de Eggsy, e pouco enfática com seus dramas, pois o humor negro utilizado anula qualquer tentativa verdadeira de emocionar em momentos específicos. 

Novamente, paralelamente e ocasionalmente, vemos os planos do vilão, que são tratados com pouca atenção durante os primeiros atos, o que reforça a impressão de que os mesmos são uma finalidade que justificam os meios dos heróis. No entanto, a resolução do maligno Valentine e sua escudeira assassina Gazelle, acaba sendo satisfatória, o que redime alguns pecados.


E balanceando os problemas, temos a condução técnica infalível de Vaugh. A edição e montagem do filme são impecáveis, e valorizam de forma extraordinária os aspectos visuais da produção. Desde os créditos iniciais, somos bombardeados por efeitos especiais sensacionais e sempre muito bem utilizados.



E o que Kingsman: Serviço Secreto na verdade deixa para posterioridade são duas sequências de ação insanamente maneiras, envolvendo um intenso combate dentro de uma igreja e a obliteração de globos humanos cadenciada por música clássica. O filme faz questão de ser gore, o que é muito legal, e contrasta bastante com a pompa de seus protagonistas. Brutal e bem apanhado.

O elenco também soma pontos positivos. Como destaques temos: o ator inglês Colin Firth com seu Galahad, chutando bundas como nunca (um ator experiente se divertindo e dando porrada), o americano Samuel L. Jackson é o hilário vilão de língua presa Valentine, Mark Strong é um relevante apoio com o frio e calculista Merlin, Michael Caine eleva o nível de requinte com o fatalista Arthur, Sofia Boutella chama atenção com Gazelle, matadora ao melhor estilo Oscar Pistorius, e por fim, Taron Egerton, jovem revelação que interpreta o protagonista Eggsy.


Resumindo, Kingsman: Serviço Secreto oferece sequências visualmente embasbacantes, que praticamente valem pelo filme todo. O desfecho da história é forte o suficiente para se fazer lembrar, e o elenco escalado é de primeira linha. É exatamente por estes pontos positivos que se torna decepcionante ver um desenvolvimento de trama tão quebrado. Ainda sim, pra quem curte humor, ação e muita violência, a fita é recomendada.


Curiosidade: uma ótima referência do filme ao quadrinho é a participação do ator Mark Hamill (vulgo Luke Skywalker), que aparece na HQ como ele mesmo, e no filme participa interpretando outro personagem, de propósito semelhante ao dele na HQ.



Kingsman: Serviço Secreto/ Kingsman The Secret Service: Reino Unido/ 2014 / 129 min/ Direção: Matthew Vaughn/ Elenco: Colin Firth, Mark Strong, Jack Davenport, Mark Hamill, Sofia Boutella, Samuel L. Jackson, Michael Caine, Taron Egerton, Sophie Cookson

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