Mister Lonely

Em uma comunidade afastada, um bando de sósias vive um mundo de fantasia em uma sociedade alternativa. A idéia é interessante, mas a falta de conteúdo prejudica o resultado final neste estranho filme de Harmony Korine.

O diretor Harmony Korine começou cedo suas loucuras no cinema. Seu primeiro roteiro foi do excelente “Kids” do diretor Larry Clark, (com quem também fez parceria no fraquíssimo “Ken Park”). O filme causou reboliço e chamou a atenção pelo tema forte que mostrava a realidade dos jovens americanos na década de 90. Korine tinha 18 anos quando o escreveu.

Já em seu primeiro trabalho como diretor, surpreendeu com o medonho e interessantíssimo “Gummo”, filme que explora sem medo a bizarrice humana, recheado de personagens esquisitos e muito reais, praticamente um Shockumentary. Fez o também muito interessante “Julien Donkey-Boy”, filme reconhecido como Dogma #6, do “Manifesto Dogma 95”, manifesto criado por Lars Von Trie e seus amigos e que regula várias regras para ser creditado como tal. “Mister Lonely, que foi indicado a Cannes, pode ser chamado como o filme mais linear de Korine, e talvez este tenha sido seu maior problema.

A história começa nos apresentando Michael Jackson, ou melhor, seu sósia, vivido por Diego Luna. Ele se apresenta nas ruas de Paris ou em asilos, onde tenta animar os pobres velhinhos gritando mensagens positivas como “Não Morra! Não Morra!”. Em uma dessas apresentação para idosos ele conhece Marilyn Monroe, outra sósia vivida pela excelente atriz Samantha Morton. Surge imediatamente uma atração entre os dois, mas Marilyn é casada com Charles Chaplin e tem uma filha chamada Shirley Temple. Interessante não?

A loira o convida para viver em uma comunidade alternativa, onde diversos sósias vivem em harmonia, entre eles o santíssimo Papa (que de santo não tem nada), os três patetas, Madonna, James Dean, A Rainha e muitos outros. Mediante inúmeras promessas a respeito do lugar, Jackson obviamente parte nesta literal viagem, pois sua vida na capital luz não tinha muitas direções certas. Mas como tudo é mais complicado do que parece, a convivência de tais personalidades na vila do faz de conta se mostra caótica.


Paralelamente, outra historia vai sendo construída. Um grupo de freiras vive em algum lugar da áfrica, e são coordenadas pelo padre Umbrillo (excelente Werner Herzog realizando a segunda e esdrúxula parceria com Korine, a primeira foi no já citado “Julien Donkey-Boy”). Elas ajudam nativos de regiões vizinhas e algumas vezes precisam jogar de avião alguns mantimentos em áreas remotas. Certo dia, após uma manobra brusca, uma das freiras é atirada em queda livre, e por um milagre sobrevive a queda sem nenhum arranhão. O link entre as duas histórias só se apresenta no final, onde a mensagem é clara: Não importa o milagre que você é, no final estamos todos sozinhos.

A história é muito inusitada, e tinha tudo para dar certo. Mas o humor de Korine é para poucos, e em alguns momentos, só para ele aparentemente. A grande falha é a falta de conteúdo. O diretor e roteirista (que escreveu o filme junto com Avi Korine) insiste em mostrar a solidão desses personagens, presos em corpos que não lhe pertencem, tentando se convencer de que aquilo torna o mundo perfeito, pois afinal, o que seria melhor do que duas Marilyns? Infelizmente isso não é o bastante e o longa se torna maçante. O relacionamento entre o casal central não se desenvolve bem, assim como a relação de Monroe com Chaplin, que mais parece Hitler.


Na direção Korine é muito competente e monta cenas belíssimas, que chamam a atenção. Abusa, sabiamente, de momentos inusitados, como os três patetas matando a tiros de calibre doze inúmeras ovelhas doentes da comunidade, ou então o Papa e Rainha compartilhando um baseado debaixo dos lençóis. São cenas difíceis de não serem lembradas de tão emblemáticas, por assim dizer. Como também na cena em que dezenas de freiras mergulham de um avião e novamente saem vivas. Nestas cenas de queda livre, o diretor acerta em filmar como se filmam paraquedistas. As roupas das freiras camuflam totalmente os paraquedas, e tudo fica bem surreal.
Na atuação Diego Luna não convence muito, apesar de mostrar certa sensibilidade com o personagem. Já Samantha Morton é excelente e dá um show. Inicialmente ela parece sutilmente forçada, mas isso nada mais é do que a atriz interpretando Monroe interpretando, entenderam? Como Marilyn Monroe era mais divã do que atriz, a personagem de Samantha também herda essa “qualidade” de má interprete, dando esse aspecto caricato, assim como Diego Luna tenta empregar certa delicadeza proveniente de Michael Jackson. Os demais atores nada têm de excepcional e esse é outro grande problema do longa.


A trilha é bem utilizada. A cena inicial, em que vemos Michael andando de mini moto em uma pista é toda conduzida pela icônica musica - e talvez inspiração de Korine – “Mr. Lonely” de Bobby Vinton. Uma cena pitoresca, mas que tem sua beleza.

No final, “Mister Lonely” realmente analisa a solidão humana de forma eficaz, mas a falta de ritmo e o fraco time de atores colocam tudo a perder. A linearidade não faz bem ao diretor, tão acostumado a filmes fragmentados, como suas películas anteriores. A obra acaba se tornando interessante devido a suas belas e inusitadas cenas, e também por sua trama paralela, que tem um final excelente, mas que, infelizmente, toma pouquíssimo corpo no filme, e acaba não segurando as pontas no resultado final.


Mister Lonely: Inglaterra, França, Irlanda, Estados Unidos/ 2007/ 112 min/ Direção: Harmony Korine/ Elenco: Diego Luna, Samantha Morton, Denis Lavant, James Fox, Werner Herzog, Rachel Korine, Daniel Rovai

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