Um Sonho Possível (The Blind Side)

Com o intuito de explorar a bondade humana, John Lee Hancock apresenta uma emocionante história real que exemplifica o sentido da palavra "redenção". 

Como falar de "Um Sonho Possível" sem soar um pouco piegas? É meio complicado, pois o longa, que conta a história do jogador americano Michael Oher, simplesmente abusa do politicamente correto, não que isso seja um erro. 

Oher é um jovem problemático. Calado e de rosto inexpressivo, ele seguia pela vida como um buda ou algo parecido, até que Leigh Anne Tuohy - uma mulher de classe alta e de personalidade forte - o adotou como filho. O jovem vagava pelas ruas, procurando um lugar quente para dormir, quando sua nova mãe o acolheu.

Sem família e nem rumo certo, Oher estava morando com os pais de um amigo (o único talvez), que de repente se mudaram sem ao menos avisar para onde iam. Estudando em Mississipi, na escola do filho de Leigh Anne, ele era figura conhecida de todos, por ser negro, muito alto, forte, de pouquíssimas palavras e amigos. Um tipo inusitado em um local que já foi epicentro de conflitos raciais. Com diversos problemas de aprendizado, era considerado um desafio entre os professores, que não enxergavam uma maneira de ensinar o garoto. Acabaram descobrindo que por trás das poucas palavras havia um ouvinte, e através de métodos especiais a escola alcançou o aluno, e consequentemente o aceitou como um deles. Ele começou a se sair bem.

A amizade entre Oher e o jovem S.J, filho de Leigh Anne, foi um dos catalisadores desse resgate corajoso, aliado também à total falta de preconceito, somada a uma imensa bondade e solidariedade. Afinal S.J é um garotinho, enquanto Oher tinha vinte poucos anos (não sabem ao certo, pois ele não possuía quase nenhuma documentação). A realidade é que a família que o acolhe, composta pelos já citados S.J e Leigh Anne, juntamente ao pai Sean e a filha Collins, são uma espécie em extinção no mundo de hoje: pessoas verdadeiramente boas. Elas não são santas, cometem seus erros, têm suas dúvidas, mas se esforçam para fazer o melhor, e realmente o fazem. Verdadeiros (de fato) cristãos republicanos.


Claramente que o porte físico avantajado de Michael foi um dos fatores dele ter sido aceito na escola. Ele se mostrava apto à prática de esportes, mas seu jeitão seria um problema na hora dos treinamentos. Entretanto, o rapaz acaba encontrando seu caminho, e como já sabem, se torna um profissional do futebol americano, cobiçado por treinadores.

O diretor Lee Hancock se sai bem à frente do longa. Inspirado pela fantástica história que conta, o cineasta segue um caminho clássico, mantendo sempre o bom andamento da obra. Devido ao passado sofrido do jovem, o drama é parte fundamental, sendo exemplificado por meio dos constantes choques de realidade sentidos pela família rica, que percebe sua distância de um universo que se esgueira a margem da sociedade.

Ainda assim alguns momentos são de uma alegria tão radiante que chega a ser piegas... como na cena em que os dois irmãos treinam e fazem exercícios, se divertindo e dando risadas ao sol. Parece um comercial de margarina. É a mais pura felicidade alheia: alguns curtem, outros não suportam, mais ou menos por aí. Hancock também mostra coragem com os excelentes minutos iniciais da fita, em que, de forma didática, e apoiado por cenas reais de "football", explica a todos que esta será uma obra que explora fortemente o espírito esportivo, sem medo de pressões.


Sandra Bullock se destaca. Sua Leigh Anne segura com força o status da produção. Seu vigor e atitude são praticamente uma exteriorização de comportamento do que uma interpretação em si. É difícil personificar alguém "bom de verdade" sem parecer forçado... e atriz consegue isso. Pela atuação, ela foi premiada com o Globo de Ouro e o Oscar. Todo o simbolismo de sua personagem real tem uma força inquestionável.

Quinton Aaron também teve uma tarefa complicada. Mesmo aparentando certa simplicidade (quando visto à distância), Oher possui diferentes camadas, muito bem capturadas pelo ator. Apesar do Q.I. baixo, o jogador se revela um "sábio tolo", um homem bom e protetor, que vêm de uma infância extremamente sofrida. Um grande irmão urso.


E a surpresa acaba sendo o pequenino S.J. O ator mirim Jae Head dá um show com o personagem - que também é bom com atuação (S.J. se sai muito bem no teatro da escola) e é apaixonado por esportes. Suas cenas são as mais engraçadas, uma peça fundamental do filme.

"Um Sonho Possível" causou certa surpresa ao ser indicado entre os dez candidatos a Melhor Filme na premiação do Oscar de 2010, mostrando assim que possuía muita força própria. Sendo finalizado de uma forma que se tornou padrão para os filmes que reencenam fatos verídicos, os créditos são acompanhados de fotos e vídeos da família Tuohy. Simetricamente representados, reais e ficcionais se confundem. Nada mais comum em mundo onde a vida real é boa demais para ser verdade.


Um Sonho Possível/ The Blind Side: Estados Unidos/ 2009/ 129 min/ Direção: John Lee Hancock/ Elenco: Sandra Bullock, Tim McGraw, Quinton Aaron, Jae Head, Lily Collins, Ray McKinnon, Kim Dickens, Kathy Bates

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