Star Trek

Com os pés no futuro, J.J. Abrams remonta o passado da famosa tripulação que viaja na USS Enterprise. Com ousadia, o diretor insere muitas novidades no universo dos Trekkeis.

Primeiramente gostaria de frisar que, assim como a maioria dos principais envolvidos no filme (que desculpa esfarrapada), eu não sou um legítimo Trekkei. Não sei afirmar qual foi o exato episódio em que os Klingons fizeram sua primeira aparição, ou a primeira visita ao Planeta Delta Vega ou Bolarus IX, mas posso dizer que o diretor J.J. Abrams recheou o filme de elementos e frases clássicas que remetem a este universo viciante criado por Genne Roddenberry a mais de 30 anos atrás, mesmo que essas inserções para os fãs mais xiitas sejam feitas em pequenas doses. Com muita esperteza e ousadia Abrams deu vida a esta tripulação que parecia fadada ao esquecimento, devido aos péssimos últimos longas que não ajudaram a fortalecer o nome Star Trek.

A história apresenta os personagens mais famosos da série (Kirk e Spock), desde a infância até ao momento em que colocam seus temperamentos opostos frente a frente pela primeira vez. Eles precisam enfrentar o ameaçador Nero, romulano vingativo que não poupa nada nem ninguém. Os roteiristas Roberto Orci e Alex Kurtzman acertaram em criar um contraponto capcioso na trama, em que toda a fama da série pode ser explorada, mesmo se tratando de uma abordagem do passado dos personagens.  Entendeu mais ou menos? É isso mesmo, alterações do espaço tempo é coisa normal no futuro, e também é fator de risco para uma trama, devido aos possíveis furos que possam vir a existir, coisa que não acontece no longa. Com uma linha muito bem amarrada e, principalmente, muito bem escrita, a história, apesar de não ter grandes reviravoltas, não perde seu foco em nenhum momento e o texto não traz frases clichês ou cheias de pompa. Os personagens são palpáveis, mesmo neste universo tão fantasioso. 


Outro elemento muito interessante do roteiro é o fator cômico, muito presente na série original. A comédia de hoje em nada se compara com a de antigamente, e no filme ela chama a atenção, pois é apresentada em forma de gags ,alguns momentos em demasia, mas que não chegam a prejudicar o andamento pois funcionam bem devido a qualidade dos atores escalados. Abrams usa deste humor contagiante para colocar o público dentro da nave. 

Talvez o ponto mais falho em relação a obra original seja aquilo que faz a diferença nos dias de hoje:  as frenéticas sequências de cenas de ação. Enquanto a série é mais contemplativa e cerebral, o filme é um trem descarrilado de frames que voam e buscam os olhos de um novo tipo de público, já acostumado com essa urgência.

Já o grande trunfo da obra é com certeza o elenco. Com um verdadeiro time de estrelas em ascensão, o diretor encontrou a personificação perfeita da tripulação clássica da Enterprise, começando pelo excelente  Chris Pine, que dá vida a um rebelde e explosivo James Tiberius Kirk. Todo o descontentamento de crescer sem o pai - que foi morto em combate para salvar o filho e esposa – é expresso no momento que somos apresentados ao personagem. Logo, essa falta de destino é substituída pela curiosidade de encontrar seu limite. E é assim, meio que de supetão, que ele embarca rumo às estrelas buscando seu lugar.


É de impressionar a semelhança entre Zachary Quinto e Leonard Nimoy. O ator realmente chama atenção na pele de Spock ainda jovem, procurando se centrar em meio a um turbilhão de sentimentos e decisões que o rodeiam. Ele precisa ser racional, ser lógico, mas sua natureza humana o faz ser...vamos dizer..mais espontâneo do que ele deseja, e isso acaba sendo seu grande diferencial. Assistindo essa jornada de descobrimento de seu personagem, Nimoy interpreta o velho Spock, e com uma participação perfeita e emblemática, ele acaba por simbolizar uma passagem para os novos tempos, como uma benção de pai para filho.

Dentro da nave temos ainda Zöe Saldana, que interpreta a focada Uhura, com quem (acredite se quiser) Spock acaba tendo um envolvimento (elemento romântico obrigatório dos Blockbusters em geral). Karl Urban surpreende e entrega a melhor atuação de sua carreira como o hilário e canastrão Leonard H. McCoy, “Bones” para os íntimos. O não menos hilário Pavel Andreyevich Chekov é interpretado por Anton Yelchin, ator de origem russa que vem ganhando espaço com ótimas interpretações, como em Alpha Dog e Charlie – Um Grande Garoto.  O inglês maluco Scooty ganha vida com inglês também maluco Simon Pegg, ator que é o gênio criativo por trás de pequenas obras primas como Todo Mundo Quase Morto (péssimo titulo em português) e Chumbo Grosso (Idem), e Hikaru Sulu renasce na pele do comediante John Cho, que deixa a fase de “Harold e Kumar” de lado e parti para um momento mais sério na hora de interpretar o repaginado e habilidoso espadachim que pilota a nova Enterprise. Fora da nave temos Winona Ryder muito bem como Amanda Grayson, mãe de Spock, e no time inimigo Eric Bana faz cara de mau como o carcamano tatuado Nero, o romulano é puro ódio e Bana trabalha bem, mesmo debaixo de muita maquiagem.


A trilha sonora não lembra em nada a animada abertura da serie clássica, ao contrário, ares sombrios e mais sérios dominam as cenas.  Composta pelo competente Michael Giacchino, que já trabalhou com Abrams em Lost, Missão Impossível 3 e fez pérolas como Ratatouille. O compositor traz uma qualidade musical para o filme incomparável. É impossível imaginar este filme sem está trilha, especificamente.

Com uma produção que despensa comentários, o diretor J.J. Abrams realizou uma obra marcante. É impossível negar o impacto das belas cenas desenhadas para o filme, como por exemplo, o trágico fim do Planeta Vulcano. De forma correta o filme aborda temas como aceitação, descobrimento e reconhecimento de valores claros e imutáveis, um esperto link com a própria realidade da série até então.  O diretor afirmou varias vezes que gostaria de fazer um filme para os fãs, mas principalmente para novos fãs, e isso ele com certeza conseguirá, pois todos os elementos de sucesso estão ali: muitos efeitos especiais e boas risadas. Apesar de não seguir o time da série, o diretor, querendo ou não, presta uma homenagem aos verdadeiros “trekkies” e mostra ser “ilógico” continuar algo da mesma forma. É preciso se adaptar, é preciso evoluir.

Star Trek: Estados Unidos, Alemanha/ 2009/ 127 min/ Direção: J.J. Abrams/ Elenco: Chris Pine, Zachary Quinto, Leonard Nimoy, Eric Bana, Karl Urban, Zoe Saldanha, Simon Pegg, Anton Yelchin, Winona Ryder, Jennifer Morrison 

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