#De Igual para Igual
Em um primeiro momento, a história de Intocáveis pode parecer improvável, algo que é prontamente refutado pelos fatos reais que servem de base para o roteiro (o texto foi guiado pelo livro autobiográfico de Phillipe Pozzo di Borgo, Le Second Souffle). Focando o relacionamento de dois amigos extremamente diferentes, a obra é um divertido e melancólico quadro que explora a capacidade humana de superação, admiração recíproca, confiabilidade, respeito e outras qualidades admiráveis que todos somos capazes de alcançar.
O aristocrata francês Philippe é tetraplégico. Ele sofreu um severo acidente quando praticava paraglider, ficando imóvel do pescoço para baixo. Devido sua situação, um auxiliar dedicado era necessário. Em umas das entrevistas para preencher a vaga surge Driss, que diferente dos outros candidatos, não se preocupou em vestir um terno ou mesmo agir de forma apropriada. Na verdade, ele queria apenas uma assinatura no documento que lhe renderia um benefício francês aos desempregados.
O fato é que Driss não olhou para Philippe com compaixão, e isso fez toda a diferença. O milionário não buscava alguém que tivesse pena de sua situação, mas sim uma pessoa que lhe tratasse de igual para igual. Então ele foi contratado.
Apesar da obra não tocar abertamente na questão do preconceito racial (Driss é negro e Senegalês), ela subjetivamente aborda o tema. Porém, de maneira muito mais clara, temos uma importante análise das diferenças sociais da França, outro assunto polêmico, combustível de constantes revoltas no país. Toda essa discussão, gerada pela problemática colonização de diversos países ao redor da França (como a Argélia), foi talvez um dos motivos por trás do sucesso da fita na Europa - o filme foi o mais visto na França em 2011 e o mais rentável da história do cinema francês.
Mas o grande trunfo de Intocáveis é seu humor politicamente incorreto, por vezes ligeiramente maldoso. A incapacidade de movimentação de Philippe gera momentos hilários, resultado direto da empatia e qualidades dos atores François Cluzet e Omar Sy (Philippe e Driss, respectivamente). A direção da dupla Olivier Nakache e Eric Toledano é correta, e não foge do estilo Europeu de se fazer comédia, com cenas bem estruturadas, fotografia reluzente, um eficiente trabalho de câmera e iluminação. A trilha de Ludovico Einaudi também agrega valor extra a produção.
Como de costume, o cinema francês gosta de rir de suas diferenças regionais (vide o também muito bem sucedido A Riviera Não é Aqui). Sendo assim, diversas referências ao norte do país são citadas, algo que pode ficar fora de contexto para a maioria da audiência brasileira. No entanto elas não perdem a graça.
No final, Intocavéis nos apresenta a bela história de amizade entre dois personagens inspiradores. No roteiro, não existem reviravoltas dramáticas exageradas ou algo assim. Os problemas apresentados são reais, sendo o clima geral da produção mais positivo do que qualquer outra coisa, emocionando de forma medida e, acima de tudo, fazendo rir. Recomendado.
Intocáveis/ Intouchables: França/ 2011/ 112 min/ Direção: Olivier Nakache, Eric Toledano/ Elenco: François Cluzet, Omar Sy, Anne Le Ny, Audrey Fleurot, Clotilde Mollet, Cyril Mendy