O primeiro grande filme do sul-coreano foi o drama "Zona de Risco", que fala da relação problemática de dois soldados que se tornam amigos na fronteira da Coreia do Sul com a do Norte. Depois disso ele acelerou as coisas com a memorável trilogia da vingança, composta por "Mr. Vingança", "Oldboy" e "Lady Vingança". Era a hora então de produzir uma comédia... e assim nasceu "I'm Cyborg, But That's Ok".
Explorando o tema insanidade por um perspectiva única, Park conta a história de Cha Young-Goon (interpretada pela atriz Su-Jeong Lim), uma jovem garota que carrega um pesado fardo: ela é cyborg. Devido a sua natureza robótica, ela não pode se alimentar como as pessoas normais, o que fatidicamente torna seu corpo humano um envolucro fraco e desnutrido.
Na verdade, a família de Young-Goon já possuía uma história estranha como essa. Certo dia, a avó da garota revelou que era um rato, e por isso passava o dia todo comendo rabanetes, dieta que empesteava a casa por razões claras.
Obviamente a realidade da menina robô foi algo impossível de se levar a sério, por isso ela foi internada em um hospício, onde estavam alocados os mais variados tipos de malucos: temos um que só anda de costas, outra é uma mitomaníaca talentosíssima, e Park Il-Sun (interpretado pelo ator Rain, de "Ninja Assassino") é um ladrão sagaz, capaz de furtar a gentileza de uma pessoa, seus trejeitos e personalidade... ou até mesmo a quinta-feira.
E diante da debilidade física de Young-Goon, o meliante Il-Sun resolve ajudar, fazendo nascer assim um (dis)funcional relacionamento entre os dois, algo muito diferente de qualquer outro relacionamento que também seja estranho a beça - é válido especular que existe uma verve meio "Amélie Poulain" no filme de Park. Parece que o diretor emprestou a ambientação do amigo europeu Jean-Pierre Jeunet e a tornou asiática, sendo o resultado algo honestamente singular.
Com uma simplicidade contornada de maneira rebuscada por detalhes belíssimos e particularidades inteligentes, "I'm Cyborg, But That's Ok" é uma pequena obra prima a ser cultuada, que acerta no alvo em praticamente todos os seus quesitos técnicos e autorais - a direção de Chan-Wook Park é um festival de qualidades, tanto para os olhos desavisados como para os mais atentos.
Devido a uma minucia desmedida, o cara oferece certa eficiência inexorável, principalmente com sua cenografia impecável, a paleta de cores incrível, ângulos e cenas criativas (hora aproximadas, hora distantes e morbidamente contemplativas). O texto subjetivo encontra na narrativa o ritmo perfeito para o humor, e o elenco corresponde a altura com atuações memoráveis.
Mesmo o filme sendo de 2006, seus efeitos visuais parecem melhores do que boa parte daqueles que vemos em Hollywood nos dias de hoje. Existe muita violência por parte da incompreendida garota cyborg Young-Goon, algo que se torna surreal mediante ao humor utilizado para descrever esta explosão de sentimentos e munição.
Em resumo: Com "I'm Cyborg, But That's Ok", Chan-Wook Park passeia confortavelmente pelos caminhos da excelência cinematográfica... e o melhor de tudo: com uma comédia sobre loucura e humanos se transformando em máquinas de matar. Este filme foi apenas mais um passo deste grande mestre da sétima arte, que depois de fazer rir, optou pelo horror vampírico do excepcional "Sede de Sangue", e agora parte para as Américas com "Stoker", em que aborda um tema muito explorado pelos cineastas orientais: famílias psicóticas. Acompanhe o cara fervorosamente.