O Homem de Aço (Man of Steel)

"O Homem de Aço" de Zack Snyder poderia ser melhor, se não fosse enlatado por sua própria natureza.

Primeiramente, gostaria de dizer que não sou um fanático por quadrinhos. Tive meus bons momentos com eles, mas é algo que ficou no passado. Digo isso, principalmente, para enfatizar que minha visão deste novo "O Homem de Aço" é meramente cinematográfica, e tem como base os já conhecidos elementos característicos do herói. Com certeza existe algum arco que pode servir como uma explicação para algo do roteiro, ou que tenha claramente inspirado certo raciocínio e por aí vai. Bem, para mim isso não fez diferença. Vamos ao filme então.

Depois de entregar trabalhos que conquistaram o público, como "Madrugada dos Mortos", "300" e "Watchmen - O Filme", o diretor Zack Snyder resolveu encabeçar o reboot da franquia de um dos mais famosos super-heróis dos quadrinhos: o filho de Krypton, Super-Homem, que foi eternizado nas telas pela imagem reluzente de Christopher Reeve. Diante de um longo histórico de adaptações, a missão não se mostrava fácil, principalmente depois de "Superman - O Retorno", de Bryan Singer, ter sido rejeitado pela maioria dos fãs e basicamente esquecido pela Warner.



Snyder é um diretor competente. Sua linguagem visual é moderna, atraente e cheia de personalidade. No entanto, diante de obras como "Sucker Punch - Mundo Surreal", é possível perceber que o mesmo pode se perder com facilidade quando a estabilidade da produção não é plena. E neste caso ela não foi. 

Nos dias de hoje, a liberdade artística necessária para se desenvolver um grande clássico de ação praticamente não existe. Tudo se resume a uma equação que engloba diversas variáveis, e o resultado almejado é sempre o lucro. Assim, fitas como "O Homem de Aço" acabam sendo enlatadas por natureza, compactadas e reduzidas a um produto comercial. Este filme de Snyder tem seus valores, mas fatidicamente perde quase toda sua força diante do implacável sistema hollywoodiano.

Digo isso por que sei que o longa poderia ter sido muito mais, só que ele não teve tempo para tal façanha. 143 minutos não foram suficientes para edificar nascimento, vida e revelação de um dos maiores símbolos de esperança de nossa cultura. Os realizadores obviamente almejavam ir além, só que tiveram de se adaptar ao que foi estipulado. O que temos então é uma descompassada construção da origem do Superman, que culmina em uma genérica batalha catártica, cujo prêmio do mocinho é a credibilidade instantânea da raça humana. 

Embora estes erros sejam uma verdade inconveniente, a experiência de se assistir "O Homem de Aço" não é descartável. O filme é divertido, mas não é, nem de longe, uma obra cinematográfica de valor memorável.



O experiente roteirista David S. Goyer (que teve ajuda de Christopher Nolan), consegue encontrar a motivação correta para o temido General Zod, e também para os país Jor-El e Jonathan Kent. O texto integra de forma eficiente a repórter Lois Lane à história, fazendo dela não só um affair do herói, mas sim parte fundamental da trama. A personalidade do jovem Clark Kent, junto à sua família, é inteligentemente investigada por flashbacks, que exercem certa atemporalidade ao primeiro ato.

Porém, no decorrer da trama, nos deparemos com soluções extremamente convenientes do roteiro, soluções essas que desmantelam qualquer coesão antes estabelecida. Uma delas, que envolve a condenação e pena de Zod - por ter se rebelado contra os líderes de Krypton -, chega a ser hilária de tão inconsistente. E o problema se revela maior ainda quando este exato elemento se torna parte fundamental do desfecho. Algo rasteiro e obviamente decidido de maneira pouco natural.

O elenco trabalha bem. Henry Cavill consegue, com qualidade e distinção, dar continuidade a esta "santa entidade" chamada Super-Homem, que já foi incorporada tantas vezes em diferentes filmes e séries. Amy Adams entrega uma obstinada e compreensiva Lois Lane, Russel Crowe convence como Jor-El, Michael Shannon empresta sua feição deturpada para o vilão Zod, Diane Lane oferece seu carisma para a doce Martha Kent e Kevin Costner realiza um ótimo trabalho como Jonathan Kent, proporcionando os melhores diálogos do longa.

O grande ponto positivo de "O Homem de Aço" é sua dramaticidade. Ele realmente surpreende neste quesito. Por diversos momentos sentimos uma constante sensação de nó na garganta, alicerçada principalmente pela trilha sonora do sempre fantástico Hans Zimmer. O compositor, com suas melodias épicas e retumbantes, vai fundo na alma dos personagens, conduzindo a audiência de maneira vertiginosa por estas emoções. Um trabalho primoroso, que eleva o valor da obra e que se faz fundamental para o desenvolvimento da mesma.

A direção de Snyder, visualmente estilística, encontra seu ápice nas cenas de ação, carregadas de efeitos visuais incríveis, ricas em detalhes e massivas em termos de destruição (dessa vez o diretor não usou slow motion). A produção geral apresenta-se de forma grandiosa, com cenografia impressionante, figurinos e maquiagens excelentes. A equipe de coadjuvantes conta com bons atores, como Harry Lennix, Laurence Fishburne e a alemã Antje Traue, que interpreta Faora-Ul, vilã braço direito de Zod. Infelizmente esses atores são explorados superficialmente na trama.

Mas no final, "O Homem de Aço" é um filme mediano, e levando em consideração as expectativas formadas por sua incessante campanha de marketing, o resultado é uma grande derrota. A verdade é que o corte final não é dos melhores, e isso faz com que o andamento seja sofrível - resultado direto de uma roteirização e direção mais preocupadas em adequar do que narrar. Tudo é acelerado, descompassado. Praticamente não sentimos a passagem do tempo na história, e assim não existe imersão, não existe apego. Diante disso, explosões (mesmo que maneiríssimas de se ver) tornam-se desnecessárias, sacrifícios não parecem verdadeiros, punições não são comemoradas, e resoluções não são satisfatórias.

Eu sei que 143 minutos é bastante tempo, mas obviamente essa duração se mostrou irrisória diante das proporções almejadas para história (proporções dignas, digamos de passagem). Essa é a única explicação plausível para a decepção perpetrada por este "O Homem de Aço". Talvez com mais tempo, e consequentemente mais liberdade, a produção poderia se tornar um clássico do cinema de ação, e não exclusivamente um sucesso de bilheterias. Infelizmente as coisas nunca funcionarão dessa forma quando o assunto for adaptação de quadrinhos. Filmes como este precisam de muito dinheiro, e por isso devem se submeter a seus caprichos. 








O Homem de Aço/ Man of SteelEUA, Canadá, Reino Unido/ 2013/ 143 min/ Direção: Zack SnyderElenco: Henry Cavill, Amy Adams, Michael Shannon, Diane Lane, Russel Crowe, Antje Traue, Harry Lennix, Richard Schiff, Christopher Meloni, Kevin Costner, Ayelet Zurer, Laurence Fishburne

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