Transcendence - A Revolução (Transcendence)

Transcendência sem significado.

A ideia central de Transcendence é bem interessante. Ela propõe um cenário de evolução tecnológica em que o intelecto de uma pessoa pode ser compactado e transformado em arquivos de computador, prontos para upload. Esta consciência emulada teria as lembranças, pensamentos, até mesmo os desejos e sentimentos da mente original. Para todos os efeitos, seria uma pessoa sem corpo físico, mas teria alma afinal?

O cientista Will Caster (Johnny Depp) é o famoso nome por trás do estudo. É óbvio dizer que tamanha ousadia, que possibilita a criação de um ser onipotente, onipresente e onisciente (basicamente o google com vontade própria) desagradaria muita gente. E depois de sofrer um atentado fatal de cunho religioso, Caster se torna o candidato ideal para sua própria criação, que até aquele momento havia sido testada apenas em cobaias.

Com toda a informação do planeta em sua mente, ou melhor dizendo, em seu quase infinito HD interno, Caster inicia uma série de desenvolvimentos tidos como inconcebíveis, visando assim expandir sua influência. Ele oferece soluções permanentes para debilitantes mazelas de nossa sociedade, um salto vertiginoso no futuro, que tornaria tudo extremamente mais fácil e barato no campo da medicina, geração de energia, nanotecnologia, sustentabilidade ambiental, etc. Agora eu pergunto: que raça humana seriamos nós se aceitássemos milagres de um ser onipotente, cuja existência é incontestável? Seríamos escravos?



Ironias à parte, o principal problema da história de Transcendence foi lidar com escopo de sua própria ousadia. Criar reviravoltas humanísticas diante da ascensão de uma divindade tecnológica não é algo tão simples de desenhar, pelo menos quando a abordagem tenta ser realista. Sendo assim, depois que Caster é estabelecido como vilão da fita, as motivações do elenco são obrigatoriamente guiadas por um raciocínio de pouca lógica, no intuito de favorecer a derrota do todo poderoso. 

Isso fatidicamente dita a falta de coerência e naturalidade das cenas e narrativa, com personagens mudando de perspectiva sem uma base sólida de argumentos, entre outros problemas de construção e desenvolvimento dos mesmos. Em certo momento, vemos um estapafúrdio grupo de coalizão surgir, e sua importante missão é: elaborar soluções improvisadas que convenientemente funcionam, sendo que no final, mais da metade deste mesmo grupo é sucateado e esquecido pela trama, para que assim o desfecho consiga existir... mas de longe convencer. Uma bagunça.    

Visualmente temos algumas ideias interessantes. A construção das sequências não desfruta de muita criatividade e o andamento não é dos melhores, mas o diretor Wally Pfister possui extenso background como diretor de fotografia, e isso faz com que a experiência não seja desagradável aos olhos, pois iluminação e enquadramento combinam.



Já o time de atores é incapaz de alcançar algo além da mediocridade com suas personas (entre os nomes estão Morgan Freeman, Rebecca Hall, Paul Bettany, Cillian Murphy e Kate Mara). Johnny Depp, o único que poderia trabalhar um perfil mais aprofundado para seu protagonista cientista, parece impossibilitado de se animar com a produção. Ele oferece aquela mesma interpretação dos últimos tempos, de cara e olhos cansados, meio que consciente de que nada ali está funcionando. No entanto, quando o mesmo se torna "robótico", auxiliado por toneladas de efeitos especiais, e não precisando demonstrar sentimentos, as coisas melhoram um pouco.  

Por fim, Transcendence se perde em meio a revolução que propõe. As escolhas que conduzem o desfecho da história são baratas e rasteiras, algo bem americanista como: "devemos explodir esse miserável em um milhão de pedaços, mesmo que seja para voltar à idade da pedra, evitando a purificação de todos os rios e oceanos do mundo, evitando que pessoas paraplégicas voltem a andar, evitando até mesmo a cura do câncer. Fuck Yeah!!".

Seria interessante acompanhar uma abordagem que verdadeiramente explorasse essa complicada discussão humana, dividida entre aceitação e repúdio. Teríamos algo novo dentro do gênero, e não apenas um amontoado de ideias sem propósito algum. Não recomendado.





Transcendence - A Revolução/ Transcendence: 2014/ Reino Unido, China, EUA / 119 min/ Direção: Wally Pfister/ Elenco: Johnny Depp, Morgan Freeman, Rebecca Hall, Paul Bettany, Cillian Murphy, Kate Mara, Cole Hauser, Clifton Collins Jr.

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