O Lado Bom da Vida (Silver Linings Playbook)


Em "O Lado Bom da Vida", o diretor David O. Russell faz do termo "excelsior" seu estandarte, e transforma drama em comédia com perfeição

Pat Solitano sofre de bipolaridade. Seu casamento ruiu e ele foi demitido do emprego de professor ao ser internado em uma instituição mental - isso após agredir violentamente uma pessoa. Solitano perdeu o controle de sua vida.

Estes fatores descritos poderiam muito bem ser a base de um profundo drama que investiga males modernos ligados à depressão, síndromes, obsessões compulsivas, entre outros problemas psicológicos. No entanto, o escritor Matthew Quick resolveu usar a negatividade como combustível para a comédia em seu livro "Silver Linings Playbook".


Depois do roteiro da obra passar pelas mãos de diretores como Sidney Pollack e Anthony Minghella (ambos falecidos em 2008), ficou a cargo de David O. Russell adaptar a história para o cinema. Tocado pelo tema (seu filho sofre de bipolaridade, mesmo mal do protagonista), Russell sai então de um drama competente ("O Vencedor"), para retornar ao seu grande filão: o humor inteligente. 


"O Lado Bom da Vida" é uma comédia diferente, que provoca risos nervosos e que, além de oferecer resoluções morais sobre temas próximos do grande público, também é romântica sem ser cansativa.




Bem, depois de Pat passar pelos problemas descritos, ele fica de molho por meses na tal instituição mental, onde tem tempo para planejar seu mirabolante retorno a "vida normal" - não seria bem assim. Sofrendo para se adaptar a realidade - devido a ilusões de redenção um tanto quanto ridículas -, o homem tem guinadas dramáticas e cruéis de comportamento, o que transforma o convívio na casa de seus pais, Pat (o filho é Júnior) e Dolores, numa insanidade tremenda.   


É certo dizer que as manias de sua família não lhe ajudam muito, em especial o fanatismo do pai em relação ao campeonato de futebol americano e o poder de crendices que supostamente geram boa sorte nos jogos. A única coisa que parece exercer certa influência, mesmo ele resistindo ao máximo, é a estranha amizade com Tiffany, uma adorável e tóxica garota cheia de seus próprios e complexos dilemas. Juntos, a nova dupla de anti-heróis bola um plano para reconquistar a esposa de Solano (uma inusitada sugestão da Tifanny), e acabam então lutando para se entender durante este dúbio processo. Eles precisam acertar os passos, pois afinal, todos estão analisando atentamente... e ninguém ganha pontos se não inventar uma estratégia ousada.




O diretor David O. Russell sempre conseguiu ambientar muito bem suas histórias. Foi assim em "Três Reis", "Huckabess - A Vida é uma Comédia" e "O Vencedor". Em "O Lado Bom da Vida", suas opções narrativas enfatizam certa surrealidade, o que traz a sensação visual e psicológica da confusão mental presente em seus personagens. Ainda sim, mesmo com situações absurdas ou improváveis, Russell encontra o ritmo perfeito para fugir de exageros, oferecendo muita naturalidade.


Mas para o resultado bem sucedido da fita, foi necessário um elenco a altura, e Jennifer Lawrence é sem dúvida o maior destaque neste quesito. Belíssima e talentosa, ela possui uma simplicidade em seu jeito de ser que nos lembra alguém de nosso convívio, o que automaticamente a torna parte da família. Tiffany é perturbada, admirável e acima de tudo humana, e Lawrence parece alcançar esta equação sem dificuldades.   


Bradley Cooper também realiza um ótimo trabalho como protagonista, o primeiro "ótimo" de sua carreira para ser mais exato - "Se Beber, Não Case!" é divertido, mas o ator não foi indicado a prêmios por ele, não é? Seu Pat Solitano é completo: sua loucura comove, sua animação excelsior é hilária, certa revolta também nos faz rir, e uma arrogância esporádica causa perplexidade (de uma forma engraçada, do tipo: "que idiota!"). Mesmo com tantas incoerências, Cooper transforma Solitano em alguém compreensível, conquistando facilmente a audiência.




No time de apoio temos bons atores, como John Ortiz, Julia Stiles, Shea Whigham e até o sumido Chris Tucker (com uma eficiente participação), mas as atenções se direcionam mesmo para Robert De Niro. Muito se fala do ator andar no automático e tudo mais - é verdade que algumas de suas escolhas recentes se mostraram estranhas ou mesmo erradas, e os reais motivos deste caminho a ele pertencem (e creio que tão pouco lhe incomodam) -, mas aqueles que tripudiam de sua capacidade como ator (quando motivado, inspirado) o fazem por pura arrogância ou mera ignorância. Seu Pat Solitano "pai" é um sujeito de muitas qualidades, defeitos, manias e peculiaridades. Um trabalho complicado, mas que De Niro tira de letra.


Em resumo: "O Lado Bom da Vida" é uma comédia romântica imperdível, talvez a melhor desde "500 Dias Com Ela" (fitas assim são raras). David O. Russell consegue criar um ambiente perfeito onde todo o elenco se encontra de forma plena, e oferta interpretações memoráveis. O tema é atual e extremamente relevante, e conversa com uma multidão de pessoas (e consequentemente auxilia). No final, tudo o que a dupla Pat e Tiffany procuram é uma estratégia eficaz para viver neste lugar maluco chamado realidade, e isso é basicamente o que tudo mundo faz... todos os dias. Altamente recomendado. Excelsior.



O Lado Bom da Vida/ Silver Linings PlaybookEUA/ 2012/ 122 min/ Direção: David O. RussellElenco: Bradley Cooper, Jennifer Lawrence, Robert De Niro, Jacki Weaver, Chris Tucker, Anupam Kher, John Ortiz, Shea Whigham, Julia Stiles

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