Imagem e Semelhança
Há mais de 60 anos atrás, Asimov profetizou que a criação de uma inteligência artificial, capaz de sentir emoções iguais as nossas, iniciaria um conflito que empurraria a humanidade à beira da extinção. O homem criador seria tecnicamente um novo deus, enquanto a criatura, de raciocínio pulsante e praticamente ilimitado, enfrentaria as eternas maldições de sua existência sem propósito. Algo como Humanidade 2.0.
Está bem claro que o tema IA nunca deixará de ser algo relevante. Na verdade, parece que estamos cada vez mais próximos de desenvolver uma consciência como a que Asimov descreveu em seu Eu, Robô. O filme Ex Machina fala exatamente disso, deste ato de criação já amaldiçoado por clássicos sci-fi, mas principalmente investiga como ambas as partes (humanos e máquinas) reagiriam a esse processo inédito de convivência.
O roteiro utiliza então, como base fundamental, o teste de Turing, que determina o quão convincente é a interação da máquina com o homem, se ela realmente consegue agir de maneira autêntica diante de seu observador, a ponto de confundi-lo, humanisticamente falando. Mas, se a máquina foi feita, digamos, pra amar, fazer sexo, ou simplesmente proteger sua integridade, quais seriam os (novos e necessários) parâmetros do teste?
O diretor e roteirista Alex Garland afirmou que fez Ex Machina com o menor orçamento possível, isso por que ele queria total controle sobre o material. Mas apesar da restritiva independência financeira, a produção elencou atores de qualidade, sendo eles, resumidamente, Oscar Isaac, Domhnall Gleeson e Alicia Vikander.
A fita oferece também um visual arrasador, de estética belíssima, com efeitos especiais brutalmente realistas, que misturam verdade e ficção de forma perturbadora. A trilha sonora amplifica a sensação claustrofóbica do ambiente, e a iluminação valoriza criativamente os momentos de tranquilidade e tensão, destacando também a fotografia impecável de Rob Hardy.
Ex Machina é um filme hipnotizante. Seu andamento é lento, mas em nenhum momento sentimos a sensação de descompasso, pois toda cena é composta por um texto minuciosamente arquitetado, e as interpretações valorizam ainda mais estes argumentos.
Durante sete dias de testes, vemos a personalidade de todos os envolvidos alcançado estranhos níveis de consciência. Em um ambiente desses, parece normal que os humanos percam sua humanidade. É tudo incrivelmente surreal e desconfortante, principalmente pela crueldade implícita, que se disfarça de evolução, mas que no final é apenas loucura.
Este é um clássico sci-fi que oferece uma das mais impactantes discussões sobre a criação de uma inteligência artificial auto-suficiente. Como o próprio nome do filme sugere, a robô protagonista, Ava, é literalmente uma Deus Ex Machina, que veio para alterar o destino dos homens definitivamente. Recomendado.
Ex Machina: Reino Unido/ 2015 / 108 min/ Direção: Alex Garland/ Elenco: Alicia Vikander, Domhnall Gleeson, Corey Johnson, Oscar Isaac, Sonoya Mizuno